A cada tombo que levo pela maldade do outro, me fortaleço, por ver que sou diferente, e que não uso das mesmas armas. O que ganho? Tranquilidade ao colocar a cabeça no travesseiro.
Tem sido assim, meu jeito de ser, minha filosofia, minha maneira de ver a vida – e viver.
Não. A tarefa não é fácil. Eis uma dura e árdua batalha. Que desafio é este ‘imposto’ pelo cristianismo, de que é preciso amar até o inimigo? Como esquecer mágoas, rancores e decepções deixadas pelo outro e, diante disto, continuar amando?
Quais são as respostas? O que diria você, caro leitor?
Mas isto é da condição humana. Segundo Fábio de Melo, o padre, “a vida cristã nos coloca na condição de "canteiro de obras". Nunca estamos prontos”. E que bom que seja assim. Vamos caminhando, vamos aprendendo a ser um Ser. E neste desafio, convivendo com as agruras da vida. Tudo bem, não é fácil. Mas quem disse que seria?
Aliás, Oscar Wilde apontou um dia: “Não deixe de perdoar os seus inimigos - nada os aborrece tanto”. Que coisa, não? Profunda.
Dia desses, perguntaram-me sobre o que penso sobre tudo isso e qual minha posição diante de tal cenário. “Se tenho inimigos e como trato este assunto”.
Respondi: os admiro. Afinal, eles sempre estão na platéia. Ficam ali a me olhar, não aplaudem – é óbvio – mas sempre estão ali. Eu os vejo e sigo em frente. Enquanto o ódio os corrói por dentro, prossigo, vivo. Eles não, coitados. Ficam na expectativa em ver meu fracasso. Não vivem. Suas atenções se voltam a mim. Eu sigo.
Como disse, não uso das mesmas armas. Aliás, tenho um compromisso. Assim como disse Fábio de Melo (outra vez): “Meu compromisso cotidiano é expulsar o ouriço que tenho na alma”. Uma metáfora perfeita.
O ouriço é aquele bichinho que conta com a sua coloração como camuflagem, mas quando ameaçado enrola-se como uma bola expondo apenas a face coberta de espinhos. Estes espinhos o protegem do inimigo.
Mas então, expulsar o ouriço da alma, é isso, jogar fora estes espinhos que, estando por dentro, como se a nos proteger, apenas vão nos ferindo. Na alma então, como aponta o sacerdote, é machucar a cada segundo, a cada respirar. Como se estivesse dizendo: não é ao outro que você está fazendo mal. É a ti mesmo.
Ter um ouriço é ter ódio, rancor, mágoas pelas ações, atitudes ou jeito de ser do outro e, ao desejá-lo o mal na mesma intensidade das nossas feridas, abertas por ele, acabamos fazendo – e trazendo – o mal a nós mesmos. Mais um desafio. Mais uma tarefa. Outro ‘inimigo’ a ser destruído por nós mesmos: o ódio que vive em nós.