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quinta-feira, 19 de abril de 2012

Livrar-se do ouriço de nossa alma

Pois bem, não guardo mágoas...sou deste jeito. Acredito no Humano ser. 
A cada tombo que levo pela maldade do outro, me fortaleço, por ver que sou diferente, e que não uso das mesmas armas. O que ganho? Tranquilidade ao colocar a cabeça no travesseiro.
Tem sido assim, meu jeito de ser, minha filosofia, minha maneira de ver a vida – e viver.
Não. A tarefa não é fácil. Eis uma dura e árdua batalha. Que desafio é este ‘imposto’ pelo cristianismo, de que é preciso amar até o inimigo? Como esquecer mágoas, rancores e decepções deixadas pelo outro e, diante disto, continuar amando?
Quais são as respostas? O que diria você, caro leitor?
Mas isto é da condição humana. Segundo Fábio de Melo, o padre, “a vida cristã nos coloca na condição de "canteiro de obras". Nunca estamos prontos”. E que bom que seja assim. Vamos caminhando, vamos aprendendo a ser um Ser. E neste desafio, convivendo com as agruras da vida. Tudo bem, não é fácil. Mas quem disse que seria?
Aliás, Oscar Wilde apontou um dia: “Não deixe de perdoar os seus inimigos - nada os aborrece tanto”. Que coisa, não? Profunda.
Dia desses, perguntaram-me sobre o que penso sobre tudo isso e qual minha posição diante de tal cenário. “Se tenho inimigos e como trato este assunto”.
Respondi: os admiro. Afinal, eles sempre estão na platéia. Ficam ali a me olhar, não aplaudem – é óbvio – mas sempre estão ali. Eu os vejo e sigo em frente. Enquanto o ódio os corrói por dentro, prossigo, vivo. Eles não, coitados. Ficam na expectativa em ver meu fracasso. Não vivem. Suas atenções se voltam a mim. Eu sigo.
Como disse, não uso das mesmas armas. Aliás, tenho um compromisso. Assim como disse Fábio de Melo (outra vez): “Meu compromisso cotidiano é expulsar o ouriço que tenho na alma”. Uma metáfora perfeita.
O ouriço é aquele bichinho que conta com a sua coloração como camuflagem, mas quando ameaçado enrola-se como uma bola expondo apenas a face coberta de espinhos. Estes espinhos o protegem do inimigo.
Mas então, expulsar o ouriço da alma, é isso, jogar fora estes espinhos que, estando por dentro, como se a nos proteger, apenas vão nos ferindo. Na alma então, como aponta o sacerdote, é machucar a cada segundo, a cada respirar. Como se estivesse dizendo: não é ao outro que você está fazendo mal. É a ti mesmo.
Ter um ouriço é ter ódio, rancor, mágoas pelas ações, atitudes ou jeito de ser do outro e, ao desejá-lo o mal na mesma intensidade das nossas feridas, abertas por ele, acabamos fazendo – e trazendo – o mal a nós mesmos. Mais um desafio. Mais uma tarefa. Outro ‘inimigo’ a ser destruído por nós mesmos: o ódio que vive em nós.  

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Ao povo, a rua

Circulei entre eles, por alguns minutos. Vi em seus olhares o desejo de dias melhores. Mas também, a certeza de que a batalha é válida.
Nossos agricultores tomaram as ruas de Santa Rosa na manhã desta quinta-feira. Com gritos de guerra, empunhando bandeiras, eles deixarem seus lares, suas propriedades onde o verde sumiu neste último verão, e por aqui marcharam.
Protestaram indignados contra governos, contra projetos – ou falta deles – contra descasos, desmandos e mostraram estarem esperançosos por políticas públicas que os atendam. Tudo válido. Tudo verdadeiro.
Circulei entre eles, por alguns minutos. Prestei atenção em seus olhares.
Não se importavam com o forte calor da manhã. Afinal, esta é a rotina diária.
Ferramentas nas mãos calejadas e o sol a queimar a pele, vivem na lida. Na dura lida e com os sonhos de dias melhores.
Eles protestaram. Tomaram às ruas. Tinham bandeiras. Importantes bandeiras a defender, das quais, muitas ‘eternas’. Marcharam em um grito de alerta.
Enquanto isso, nas calçadas, nas sombras de árvores ou das marquises, ou dentro dos prédios climatizados, em seu trabalho ou apartamentos, o povo os assistiam. Talvez a se perguntar: De novo vocês?
Os agricultores nas ruas. Protestaram. Pediram. Mostraram a cara em mais uma quente manhã.
No mesmo instante, pelas redes sociais na Internet, internautas postavam sua indignação por causa da corrupção no país, do descaso com a saúde pública no país e até mesmo pelos buracos das ruas da cidade – que aliás, estão desaparecendo neste ano ‘atípico’.
Nossos colonos na rua. Circulei entre eles. E neles eu vi o sorriso no rosto. Uma alegria por saber que é preciso lutar. Meninos, eu vi. E gostei do que vi.
Bandeiras na rua – não partidárias – em prol de ideais.

“Vem, vamos embora
que esperar não é saber.
Quem sabe faz a hora
não espera acontecer”Geraldo Vandré   

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Sim, Cidadão

Na última semana, como tem ocorrido costumeiramente, cumpri compromissos em Porto Alegre junto ao Sindicato dos Radialistas, do qual sou um dos diretores.
Ir à Capital, me faz bem. Não porque retorno à minha cidade natal, mas é pelo fato de gostar do contato com a parte cultural tão presente, por todos os lados da grande metrópole.
Me encanta o povo, no seu ir e vir, correndo – sempre correndo – apressadamente, mas com um sorriso no rosto. Alegre, como se estivesse a enaltecer a vida – independente dos desafios diários – e da distância.
Mas não foi o teatro, o museu, o pôr-do-sol no Guaíba, ou shows – na semana de aniversário de Porto Alegre – que me chamaram a atenção e que serviram de inspiração para este texto. Não quero falar da viagem, mas sim, como sempre me proponho, das coisas que vi.
Eis a cena: 
Praça da Matriz, Palácio Piratini, Assembléia Legislativa, Tribunal de Justiça e Catedral Metropolitana, todos, em seus majestosos espaços arquitetônicos, históricos e – diga-se de passagem, exageradamente ricos. Sim, o centro do Poder gaúcho reúne prédios que, mais do que uma beleza infinita, e valor histórico-cultural incalculável, demonstram de forma pomposa, que ali irmana o Poder e que, para ali estarem abrigados líderes da Justiça, o governador do Estado, os 55 deputados eleitos pelo povo e o líder maior da Igreja no RS, foram necessários fartos recursos...do povo.
Ali na Praça sentei para descansar, apreciar a paisagem. Ali fiquei a refletir. E eis que uma cena me chama a atenção.
Em frente à igreja, sim aquele majestoso espaço para oração dos católicos, bem ali, onde o cristão busca alimentar sua fé, uma senhora sentada ao chão da calçada fria, pedia esmola.
Como cristão que sou, e naquele tarde, como turista que estava, entrei para rever o templo, aberto à visitação, e ter meus minutos de intimidade com o Deus que acredito.
Mas a cena não saia da cabeça. Em frente à igreja, situada no centro do Poder, uma mulher, um ser humano, pobre, com olhar sofrido, pedia esmola.
Não me concentrava, não dava. Talvez fosse ‘fita’. De repente, o olhar indiferente dos que por ali passavam era natural por saberem que golpes são diários, e ali poderia estar mais um.
Rezei, agradeci, pedi por mim, por nós, por todos, e por ela. Mais do que isso, ao sair, lhe alcancei moedas. Não ouvi sua voz, não vi um sorriso em seu rosto. Aliás, não vi seus olhos, pois ela, mergulhada na miséria humana em que se encontrava, parecia ter vergonha da situação.
Ainda não esqueci do ocorrido, mesmo tendo visto, em diversos locais da Capital, homens dormindo em calçadas, maltrapilhos, tendo a rua como seu mundo, seu lar, ela era a cena mais forte. Doeu. E ainda dói.
Mas meus caros amigos, o fato serve de reflexão. Vem como metáfora. Não tenho a resposta. Minha intenção não é dar resposta. Mas fica a pergunta: Por que, no centro do Poder, uma mulher na calçada pedia esmola em frente á igreja? Por que não estava ela, nos portões da Assembléia Legislativa, onde poderia de repente encontrar um deputado, talvez, quem ela ajudou a eleger e que deveria estar criando leis a seu favor?
Por que aquela senhora não estava na porta do Palácio, e talvez ali se encontrasse com o próprio governador, responsável por políticas públicas a seu favor?
Ou então, por que não se abrigara na porta TJ/RS, onde poderia se deparar, e de repente até ser atendida por um magistrado, responsável por fazer justiça, quem sabe, sua própria?
Pó que na igreja? Continuo a pensar no assunto. E a imaginar quais seriam as respostas.
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“Tá vendo aquele edifício moço
Ajudei a levantar.
Foi um tempo de aflição
Era quatro condução
Duas pra ir, duas pra voltar.
Hoje depois dele pronto
Olho pra cima e fico tonto
Mas me chega um cidadão
E me diz desconfiado
Tu tá ai admirado?
Ou tá querendo roubar?!...(Cidadão – Zé Geraldo)